Suponhamos, como propôs o economista Persio Arida em artigo na Folha (“O FGTS e a liberdade econômica”, Ilustríssima, 20/10), que o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço deixe de existir. Seria possível equacionar o financiamento de longo prazo para a construção de empreendimentos de habitação popular e obras de saneamento básico?
Arida argumenta que sim. No entanto, admite que faltam bons marcos regulatórios e uma lei geral de garantias para substituir o crédito direcionado do FGTS. E defende que o lugar certo para se oferecer subsídio habitacional é o Orçamento da União, mediante ajuda em dinheiro diretamente ao comprador do imóvel.
Na mesma direção, o ministro do Desenvolvimento Regional, Gustavo Canuto, anunciou na semana retrasada que o governo estuda destinar recursos para que famílias de baixa renda comprem a casa própria, construam-na ou reformem suas moradias atuais.
Em 2020, não há previsão para tanto no Orçamento da União. A rala verba de R$ 2,7 bilhões reservada para o Desenvolvimento Regional deverá cobrir os custos das 261 mil unidades habitacionais em construção do programa Minha Casa, Minha Vida (MCMV).
Graças ao subsídio e ao financiamento que saem FGTS, as obras das outras 392 mil unidades das faixas 1,5 e 2 do MCMV prosseguem, e centenas de milhares de novas poderão ser edificadas ao longo dos próximos anos, gerando grande volume de moradias e de emprego formal.
O risco de subsidiar diretamente a população de baixa renda é que os recursos públicos acabem sendo gastos em autoconstrução informal e precária, sem atender os requisitos mínimos de desempenho e sustentabilidade, e não gerando emprego formal.
Que os R$ 66 bilhões do FGTS deixem de financiar e subsidiar a habitação popular, dividindo-se estas tarefas entre o mercado financeiro e o Orçamento da União, não se coaduna com a realidade atual nem com aquela desenhada para os próximos anos.
Por mais que se concorde teoricamente em que o crédito direcionado não seja a solução ideal, não se vislumbra que o poder público tenha capacidade de reduzir gradualmente seu endividamento e ao mesmo tempo dispor de recursos vultosos para financiar a habitação popular e o saneamento básico.
Precisamos aperfeiçoar o MCMV, além de buscar alternativas como concessões, parcerias público-privadas, locação social e outras soluções que voltem a incrementar a produção de moradias para a população de baixa renda e estações de saneamento básico.
Da mesma forma, é preciso tomar o máximo cuidado para não se desmontar um programa habitacional que conseguiu entregar mais de 4 milhões de moradias em 10 anos, sem colocar no lugar uma política habitacional que dê conta de erradicar o déficit habitacional de mais de 7,7 milhões de moradias.
Opinião do SindusCon-SP publicada na Folha de S. Paulo em 27/10/2019